segunda-feira, 18 de julho de 2011

TECNOLOGIA | Banda (quase) larga

São Paulo - Encravada entre montanhas e cortada pelo rio Pardo, a cidade de Caconde, distante 290 quilômetros da capital paulista, na divisa com minas Gerais, tem quase 20 mil habitantes e vocação para esportes radicais e de aventura, o que atrai muitos turistas.
Com esse perfil, ter um bom serviço de banda larga parece indispensável. Mas não é o que acontece. Na prefeitura da cidade, a conexão discada alcança 52 kbps*, uma velocidade de tartaruga. Se num momento de ócio um funcionário público de Caconde resolvesse baixar um filme pela internet, ele levaria 7 dias, 23 horas, 27 minutos e 10 segundos para aterrissar num dos micros da prefeitura.
http://ads.abril.com.br/RealMedia/ads/adstream_lx.ads/infoexame/plantao/1303937365/Bottom/AbrilDefault/default/empty.gif/7954676e4355346b4c6a6f414138734cEm Macapá, capital do Amapá, cidade com cerca de 400 mil habitantes, falar pelo Skype, assistir a um vídeo do YouTube ou fazer uma transação pelo internet banking são atividades nada corriqueiras para a maioria da população. Veja o caso do empresário Rafael Lamarão, 27 anos. Ele paga 200 reais ao mês para ter internet com velocidade de 256 kbps, que chega por rádio. "Meu sonho é que a fibra venha logo", diz Lamarão.
No país dos contrastes, a conexão de banda larga não é exceção. Os moradores dos bairros populosos das grandes capitais não têm muito do que reclamar de sua conexão à internet. Já aqueles de cidades do interior e de regiões mais distantes, como Macapá, não podem dizer o mesmo. Eles são atendidos, na maioria das vezes, por provedor único que cobra caro e oferece um serviço ruim.
Para avaliar a qualidade da banda larga no Brasil, INFO analisou a conexão de 5 892 leitores, que nos últimos seis meses mediram a velocidade do acesso que usam principalmente em casa. Foram 11 208 medições válidas, em 828 cidades de norte a sul do país. Trata-se do maior teste de banda larga já feito pela revista. Em 17 dos 27 estados avaliados, a velocidade de download ficou abaixo da média nacional registrada, que chegou a 4,470 Mbps. Já a velocidade média de upload não ultrapassou 637,7 kbps.
*A prefeitura municipal da Estância Climática de Caconde (SP) esclarece que tem um link dedicado com velocidade de download de 7 Mbps. Desses, 4 Mbps são destinados à população pelo programa de acesso gratuito Cidade Digital. A conexão é distribuída por rádio e a velocidade final fica na faixa de 64 kbps – exatamente o valor testado pelo participante que avaliou sua conexão com o medidor de velocidade do site da INFO.
Isso significa que para a maioria dos brasileiros a velocidade média de download é suficiente para navegar de forma satisfatória. Mas para o upload, a situação é bem diferente. Uma família que queira, por exemplo, transmitir ao vivo o aniversário do filho precisaria, no mínimo, de 1 Mbps, ou quase o dobro da média registrada nos nossos testes. O site de streaming Ustream recomenda 1,5 Mbps para uma qualidade de vídeo apenas satisfatória. As análises mostram que a velocidade de upload é apenas 14% do registrado para downloads.
O teste da INFO foi realizado com um medidor que os leitores rodaram em seus computadores, que afere a velocidade e a qualidade da conexão. Fruto de uma parceria com o NIC.br/Ceptro.br, órgão responsável por analisar a internet no país, o medidor é uma aplicação em Java que utiliza a rede PTT (entroncamento de rede que liga os provedores para a troca de tráfego) para fazer as medições de velocidade com os principais protocolos de comunicação utilizados na rede. Problemas como atrasos e falhas também foram avaliados.
Para chegar às médias, INFO considerou as cidades onde foram feitas ao menos oito medições. O Ceptro.br usa esse medidor há um ano e meio e vem observando evolução nas conexões no país. "De dezembro em diante, houve um aumento significativo na velocidade de download", afirma Fabrício Tamusiunas, supervisor de projetos do Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR (NIC.br). Esse aumento é ref lexo da maior oferta de serviços, principalmente nas capitais.
Um leitor de São Paulo, que assina o pacote de 100 Mbps do provedor Ajato, da TVA, conseguiu o recorde de velocidade de download no teste: 63,073 Mbps. Apesar de não ser a velocidade nominal e considerando as perdas naturais dos protocolos de comunicação, trata-se de uma excelente marca. Esse leitor poderia, por exemplo, baixar um filme de 120 minutos em alta definição (720p) em 9 minutos e 2 segundos. Um contraste e tanto com a marca obtida na prefeitura de Caconde, a lanterna do teste.
Os melhores serviços
Entre as operadoras de banda larga, o destaque vai para a GVT, que vem expandindo seu serviço com agressividade tanto em preço quanto em velocidade e obteve nota 6,7 do INFOlab, a maior do teste. Presentes em 94 cidades de 18 estados, os planos Power da GVT começam em 5 Mbps de download nominal e preço de 49,90 reais. Mas não é apenas a internet que é veloz na GVT. Os processos de inovação também. Para lançar a conexão de 100 Mbps, a primeira que chegou ao mercado, foram necessários apenas 15 dias, da concepção ao treinamento dos vendedores. Nada mau para um mercado em que a disputa é cada vez mais acirrada.
Nas cidades onde a GVT entrou, os preços caíram e a qualidade dos concorrentes melhorou. Na base de clientes da empresa, a velocidade contratada mais comum é a de 10 Mbps (69,90 reais), mas deve subir para 15 Mbps (79,90 reais) até o final do ano. Entre as grandes operadoras, a GVT é a menor em número de assinantes, com 1,1 milhão de clientes. Na segunda posição do ranking aparecem empatadas a NET, com o Vírtua, e a Telefônica, com o Speedy. A operadora Oi, a maior do país em número de clientes, ocupa o terceiro lugar. Embratel, Ajato e CTBC Algar Telecom não obtiveram número suficiente de medições para constar no ranking nacional.
Com o aumento da oferta de velocidades de conexão no Brasil e no mundo, o conceito de banda larga vem mudando e já se fala, por exemplo, em superbanda larga, quando a conexão é superior a 10 Mbps. Entre os leitores que participaram do teste da INFO, as velocidades contratadas mais comuns são de 1 Mbps, 2 Mbps e 10 Mbps. Elas refletem  o cenário brasileiro, embora a faixa de 2 Mbps esteja desaparecendo do serviço das operadoras. Aqui, um parêntese. (Esteja sempre atento. Caso seu plano seja extinto pela operadora, renegocie preço e velocidade para não pagar mais caro por um serviço que não é mais ofertado a novos entrantes.)
No país, 48% das conexões variam entre 512 kbps e 2 Mbps e apenas 5,5% dos usuários residenciais contratam velocidades superiores a 8 Mbps. Na outra ponta, 7% ainda usam conexão discada. É o caso da estudante Thais Mota de Andrade, 19 anos, que mora na zona leste de São Paulo. "Se acesso vídeos, trava tudo", diz Thais. Para navegar nas redes sociais, checar e-mails e fazer buscas, ela não tem muitos problemas, mas precisa exercitar a paciência enquanto as páginas carregam. A família de Thais assinou o Speedy, da Telefônica, mas acabou desistindo do serviço porque a qualidade era muito ruim na região. Hoje, eles fazem parte dos 500 mil clientes da Telefônica que ainda usam conexão discada no estado de São Paulo.
Números do Ibope Nielsen Online do último trimestre de 2010 apontam que 73,9 milhões de pessoas acessam a internet no Brasil, seja em casa, no trabalho ou em locais públicos. Isso representa um crescimento de quase 10% em um ano, embora o alcance da internet ainda seja inferior a 40% da população brasileira. A boa notícia é que o acesso domiciliar cresceu 24% entre 2009 e 2010, chegando à casa de 52,8 milhões de pessoas. Além de usar a internet em casa, cada vez mais consumidores optam pelos smartphones. Tanto que os acessos móveis ultrapassaram os fixos no ano passado. São atualmente 24,4 milhões de acessos por celular e modems 3G, contra 14,5 milhões pelo ponto fixo.
Para a nova classe média
A banda larga móvel dá saltos anuais. No ano passado, cresceu 138% e a estimativa é de chegar ao fim deste ano com 32 milhões de conexões. Entre móvel e fixa, quase 41 milhões de pessoas têm banda larga no país. "Há um boom. As pessoas querem comprar telefones e computadores. Mas na banda larga muitas vezes não há oferta ou quando existe, não há qualidade", diz Vinicius Caetano, analista sênior da consultoria Pyramid Research.
Esse boom acompanha o crescimento da classe média brasileira. "A banda larga está crescendo nas classes C, D e E. Os gastos com os serviços de telecom já representam 2,6% do orçamento", diz Nelson Wortsman, diretor de infraestrutura e convergência digital da Brasscom (Associação Brasileira de Empresas de Tecnologia de Informação e Comunicação).
Um dos maiores problemas para a expansão do acesso à internet no Brasil é estrutural. "É muito difícil construir uma nova infraestrutura de banda larga. E remendar a atual não adianta", afirma Eduardo Tude, presidente da consultoria Teleco. Para Tude, essa construção só será feita com esforços das operadoras e do governo, com o Plano Nacional de Banda Larga (PNBL).
Há casos em que a expansão da rede esbarra na complexidade de instalar fibra nas grandes cidades. É o que acontece hoje, por exemplo, com a GVT em São Paulo. Para chegar a uma cobertura mínima de 30%, e assim viabilizar a operação na cidade, a GVT tem esbarrado na necessidade de uma grande quantidade de licenças municipais para instalar seus cabos de fibra óptica. "Cada obra tem uma licença específica. Às vezes é ambiental, em outras é de patrimônio histórico ou simplesmente de permissão de horário para o trabalho numa via", afirma Alcides Troller, vice-presidente de marketing e vendas da GVT.
Em lugares mais distantes dos grandes centros, como Macapá, onde mora o empresário Rafael Lamarão, o custo é mais alto. Lá, a Oi oferece duas opções do serviço Velox. A conexão de 256 kbps tem preço de 220 reais mensais e a de 512 kbps custa 430 reais. Provedores menores no interior de outros estados, como em Balsas (MA), chegam a cobrar 460 reais pela velocidade de 512 kbps. "O preço da banda larga no Brasil ainda destoa muito do de outros países e impede que muitos comprem o serviço", diz Caetano, da Pyramid Research.
O que fazer para mudar esse cenário? Na opinião do especialista José  Roberto Mavignier, da consultoria Frost & Sullivan, é preciso aumentar a competição e reduzir o impacto da carga tributária. Nas grandes cidades, sobretudo nas mais populosas, a presença de pelo menos duas prestadoras de serviço tem elevado a qualidade e diminuído o preço. O problema está no interior do Brasil. Os altos custos de implantação e o baixo retorno afastam as operadoras.
É esse espaço que o PNBL deve ocupar. Lançado no ano passado, o plano deveria contribuir para a massificação da banda larga no país. A Telebrás, estatal dedicada à área, deveria operar como mais um concorrente. Mas, na prática, nada se viu ainda para cobrir os buracos na infraestrutura. A presidente Dilma Rousseff fala em velocidade de pelo menos 1 Mbps para todos os municípios do país, mas técnicos do Ministério das Comunicações afirmam que isso é inviável. “É muito difícil tomar o Brasil todo por apenas uma referência. Nos grandes centros urbanos, é possível contratar o serviço de 1 Mbps mais barato. Quando vamos para o interior fica complicado”, afirma Eduardo Neger, presidente da Abranet (Associação Brasileira de Internet). Estados como São Paulo e Paraná desoneraram o serviço ao criar a chamada banda larga popular. Com isso, o preço para 1 Mbps caiu para 29,80 reais. "Oferecemos esse preço nos dois estados e faremos o mesmo em todos os que diminuírem a carga tributária", afirma Rodrigo Marques, vice-presidente de estratégia e gestão operacional da NET.
Com a expansão da banda larga, aumentam também as reclamações nas entidades de defesa dos direitos do consumidor. “O serviço deveria ser prestado em regime público, mas é privado", afirma Veridiana Alimonti, advogada do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor). “Com isso, pode haver uma massificação, mas não a universalização." A Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) recebe uma média de 18 mil reclamações mensais. As principais são sobre reparos no serviço.
Benefícios indiretos
Um país com maior inclusão digital tem sua economia aquecida e pode aumentar o nível de educação de seus cidadãos. Dados do Banco Mundial indicam que 10% de aumento nas conexões de banda larga podem elevar o Produto Interno Bruto em até 1,4%, especialmente em nações em desenvolvimento como o Brasil. "A banda larga é um ponto estratégico para o desenvolvimento, a educação e o trabalho", diz Nelson Wortsman, da Brasscom. A relação entre o PIB per capita e a porcentagem de pessoas com acesso à internet é direta. Quanto mais rica uma nação, mais gente navega. No Brasil, o grande desafio agora é trazer o interior para o patamar das grandes capitais. Só assim o brasileiro poderá dizer quetem uma banda larga de qualidade.
Fonte: INFOLAB – Clique aqui para ler a publicação original no site da INFO.

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